A qualquer dia, a qualquer hora, a um toque do seu celular. A invasão de textos publicitários por torpedos, que entram no celular até mesmo de quem nunca teve contato com aquelas empresas, é queixa cada vez mais frequente entre os consumidores. E a pergunta recorrente é: onde conseguiram meu número? As empresas negam, mas especialistas afirmam que há risco de que dados pessoais estejam sendo usados de forma indevida e alertam os consumidores para que redobrem os cuidados com suas informações.
Como explicar, por exemplo, que uma pessoa que há três décadas não come carne vermelha esteja no cadastro para recebimento de mensagem publicitária via SMS de uma churrascaria?
— Embora nunca tenha pisado lá, recebo, ao menos, uma mensagem mensal do Carretão. Como conseguiram meu contato? — pergunta a aposentada Vânia Furtuna, uma de vários cariocas que se queixam da churrascaria.
A professora Maria do Carmo Azevedo também não suporta mais o tilintar do celular avisando das mensagens com ofertas que vão de serviços de telecomunicações a linhas de crédito. As mais frequentes, queixa-se, têm como remetente Nextel, Banco do Brasil, Itaú e Claro.
— Nunca fui cliente ou fiz cadastro nestas empresas, mas, toda semana, recebo SMS. A insistência me incomoda. Perco meu tempo, pois, a cada sinal, paro para ler, na expectativa de que possa ser algo importante, alguém da família — conta.
A funcionária pública Lucília Machado diz que não tem folga nem no sábado e no domingo:
— O Santander e o Itaú me perseguem até no fim de semana. Tenho conta em outro banco há 34 anos, mas eles não desistem de mim.
‘Mercado ainda obscuro no Brasil’
— O Marco Civil vai além e determina que coleta, armazenamento e tratamento dos dados só podem ser feitos com autorização expressa. Dados pessoais são o novo ouro negro. E o consumidor ainda não tem noção do valor dessas informações. Quando um serviço ou aplicativo é gratuito, tenha certeza de que o produto é você — alerta Magrani.
Segundo Bárbara Simão, pesquisadora em Direitos Digitais do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), a prática das empresas indica que há uso indevido de dados:
— Esse tipo de prática demonstra que este mercado no Brasil ainda é muito obscuro. Não há uma lei de proteção de dados pessoais que efetivamente proteja o cidadão. A discussão e a aprovação desta lei, a criação de uma autoridade competente e de sanções ao uso indevido de dados pessoais é urgente. O cenário atual é de desproteção.
Patrícia Dias, supervisora do Procon-SP, diz que identificar de onde vazaram os dados é algo que o órgão ainda não conseguiu fazer:
— O consumidor pode pedir à empresa que cesse os contatos, que tire seus dados do cadastro e também exigir a origem das suas informações pessoais. Mas, quando fazemos esse pedido, as empresas judicializam e não nos respondem.
Em São Paulo, há uma lei sobre o bloqueio de ligações de telemarketing. Mas os torpedos, diz Patrícia, não foram incluídos na legislação. A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), no entanto, determina no artigo 3º do Regulamento Geral do Direito do Consumidor de Telecom o direito de não receber mensagem de cunho publicitário oriunda de prestadoras de serviços de telecomunicações, exceto com consentimento prévio. Em caso de descumprimento, afirma a reguladora, as operadoras estão sujeitas a sanções, que podem chegar a R$ 50 milhões.
Difícil rastrear uso indevido de dados
Sidney Rosa, subcoordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Tutela Coletiva de Defesa do Consumidor do Ministério Público do Rio de Janeiro, diz que as promotorias têm estudado como atuar nesses casos, mas admite que é bastante complicado:
— É uma cadeia de empresas e prestadores de serviços complexa. É difícil rastreá-los.
Apesar do relato de consumidores, Nextel, TIM, Oi e SulAmerica dizem não enviar SMS a quem não é cliente e respeitar a legislação vigente. O Itaú Unibanco também diz cumprir a lei, mas afirma que a prospecção de clientes via SMS para produtos e serviços é prática comum do mercado. NET e Claro, por sua vez, declaram respeitar o direito dos consumidores que optam pelo não recebimento, enquanto a Oi garante que as mensagens da própria operadora são sempre previamente autorizadas. Já o Banco do Brasil diz ter informações dos clientes a partir do cadastro preenchido pelos próprios e estes podem escolher o tipo de mensagem que quer receber, inclusive nos celulares, diretamente nos caixas eletrônicos, Mobile ou aplicativo.
Empresas dizem respeitar a lei
A Gol informa usar diferentes plataformas para se comunicar com clientes, como e-mail marketing ou SMS, e acrescenta que toda a base de dados é analisada para entender os diferentes perfis de usuários. A aérea diz respeitar a segurança dos dados.
A Churrascaria Carretão afirma não haver uma “invasão” via celular, mas sim um trabalho de marketing, por meio de vários meios, como redes sociais, e-mail marketing, mecanismos de busca. No que se refere ao SMS, diz contratar empresas especializadas, que têm bancos de dados de clientes com perfis socioeconômicos pré-determinados. Segundo a Carretão, essas empresas devem ter o consentimento expresso dos consumidores para o envio das mensagens e oferecer a eles a possibilidade de cancelar o cadastro.
Quanto à proteção de dados dos consumidores, a Vivo assegura que as informações de seus clientes não são transferidas ou compartilhadas com anunciantes. A Renner afirma que não compra banco de dados de outras empresas e pede autorização prévia para envio de mensagens.
Procurado, Santander não enviou posicionamento.
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