Senadores têm feito críticas à recomendação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que trata da liberação de presos por conta da pandemia de covid-19. Segundo alguns parlamentares, há detentos, inclusive de alta periculosidade, sendo beneficiados com alvarás de soltura e mudança de regime para o domiciliar. Pelas redes sociais, senadores lamentam e se mostram preocupados com a situação.

O Podemos ingressou com um mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar suspender a recomendação, alegando que a crise sanitária não pode ser pretexto para impunidade. Mas, segundo o senador Alvaro Dias (Podemos-PR), a iniciativa foi rejeitada pelo ministro Marco Aurélio Mello.

Ao lamentar a decisão do magistrado no Twitter, o senador publicou reportagem sobre o assassinato de uma jovem por um presidiário solto durante a pandemia. Em outro comentário, ele lamentou a fuga de um chefe de facção criminosa no Paraná, após romper a tornozeleira eletrônica.

“Beneficiado com o regime de prisão domiciliar por conta do coronavírus, o narcotraficante Valacir de Alencar foi condenado a 76 anos de prisão por crimes como tráfico de drogas, lavagem de dinheiro e porte de armas. E agora, o que terá a dizer o juiz que concedeu a domiciliar ao criminoso?”, indagou.

Já o senador Marcos Do Val (Podemos-ES) destacou a decisão de uma juíza de São Paulo que mandou para casa o ex-médico Roger Abdelmassih. A postagem do senador recebeu logo depois centenas de comentários de internautas indignados com o ocorrido.

“Abdelmassih, condenado a 173 anos de cadeia pelas atrocidades que cometeu contra suas pacientes, vai para casa. Uma juíza de São Paulo entendeu que, em razão da pandemia, ele pode passar a cumprir prisão domiciliar”, informou.

Atendimento

O benefício concedido ao traficante paranaense Valacir de Alencar também chamou a atenção do senador Major Olimpio (PSL-SP). Ele disse que a polícia enxuga gelo, e a sociedade é obrigada a pagar a conta. Lamentou também a fuga de outro criminoso, Gerson Palermo, condenado a cem anos de prisão.

“Não chega a dar nojo? Acredite! Não é repetição da notícia de ontem: outro traficante, condenado a cem anos de prisão, rompeu a tornozeleira e fugiu após ser beneficiado com o regime de prisão domiciliar”, afirmou.

Major Olimpio defende que sejam montadas estruturas de atendimento médico dentro das penitenciárias para tratar presos com covid-19. Para ele, como os detentos são de responsabilidade e tutela estadual, não devem receber atendimento, por exemplo, em Santas Casas e hospitais municipais, que sofrem com a escassez de recursos.

— O Estado tem que colocar médicos, enfermeiros e estrutura dentro dos presídios. As Santas Casas têm que atender a população neste momento; elas não têm respirador para receber presos. São muito poucos, e é uma questão de emergência — disse em entrevista à Rádio Senado.

Já o senador Rogério Carvalho (PT-SE), que é médico, defende que é preciso garantir atendimento a todos que necessitarem. Segundo ele, trata-se de uma questão humanitária e um direito de toda a população.

— Todas as pessoas têm direito à vida, independente da condição: se está tutelado pelo Estado, se é um preso ou pessoa que goza de plena liberdade. Em caso de doença, cabe aos estabelecimentos de saúde de uma maneira geral atender a todos — opinou.

Mortandade

Indagado pela Agência Senado sobre a situação, o presidente da Comissão de Direitos Humanos (CDH), Paulo Paim (PT-RS), disse que o Brasil tem hoje 770 mil presos “depositados” em ambientes superlotados e insalubres, incompatíveis com a quarentena, o que resulta num “canteiro fértil para a propagação do coronavírus”.

Para ele, é desumano manter servidores e presidiários confinados em um local sem nenhuma segurança, “só aguardando a hora da contaminação em massa”.

—  Na verdade, a propagação do coronavírus nas prisões acarretará uma mortandade. Quem conhece os estabelecimentos prisionais e o sistema socioeducativo de menores infratores não tem dúvida. É preciso fazer uma testagem em massa nos presidiários e funcionários. Precisamos aumentar a segurança dos profissionais que trabalham nesses locais, que infelizmente são insalubres e insuficientes, não permitindo a ressocialização, como deveriam — afirmou.

Para o presidente da CDH, no entanto, não pode haver uma soltura indiscriminada de detentos, sem a observação de critérios rígidos.

— Lembrando que é preciso adotar alguns critérios para soltura desses presos, ou seja, quem provocou crimes como homicídio, violência doméstica, estupro, corrupção, entre outros, não entra na lista para soltura, somente presos em grupo de risco — opinou.

Estatísticas

Diante da repercussão negativa do benefício concedido a Valacir de Alencar, o CNJ informou que a Corregedoria Nacional de Justiça vai avaliar o caso. Ainda segundo o CNJ, “nos 15 dias decorridos entre a data da decisão e a soltura de Valacir, as autoridades da Segurança Pública do Paraná não informaram ao Tribunal de Justiça local a existência de mandado de prisão preventiva vigente, situação que deveria ter impedido a liberação do preso”.

Com base nos números enviados pelos governos estaduais, o Departamento Penitenciário Nacional (Depen) fez um levantamento preliminar e estimou em 30 mil apenados colocados em prisão domiciliar após a edição da recomendação 62/2020 do CNJ. O departamento informa que não vê óbice nesse tipo de medida, “desde que direcionadas tecnicamente aos privados de liberdade aptos ao benefício”.

Segundo o Depen, dez internos morreram nos sistemas penitenciários brasileiros devido ao coronavírus. Há 229 casos detectados e outros 255 suspeitos. O órgão mantém em sua página na internet um painel de monitoramento da covid-19, que é constantemente atualizado.

Fonte: Agência Senado