A notícia de que, para a Receita Federal, as sociedades individuais de advocacia não poderão optar pelo Simples Nacional já desperta críticas de tributaristas e entidades ligadas à classe. A Receita considera que a inclusão só seria válida caso fosse alterada a Lei Complementar 123/2006, que fixa normas para o tratamento diferenciado às microempresas e empresas de pequeno porte. Advogados, no entanto, consideram a exigência mero formalismo.
“A interpretação da RFB está violando a regra do artigo 110 do Código Tributário Nacional, especialmente para alterar conceitos da lei material”, afirma o procurador tributário do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Luiz Gustavo Bichara. Ele avalia que a sociedade unipessoal constitui Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (Eireli) e, portanto, está sim abrangida pelo Simples.
Bichara aponta que, durante o processo legislativo de aprovação da Lei 13.247/15, um parecer da Comissão de Constituição e Justiça do Senado já havia concluído que a sociedade unipessoal “nada mais representa do que a adequação do Estatuto da Advocacia ao art. 980-A do Código Civil, que trata das empresas individuais de responsabilidade limitada”.
Em outro parecer, assinado em agosto de 2015, o jurista Ives Gandra da Silva Martins também concluiu que as sociedades com um profissional poderiam se encaixar no Simples. Isso porque a Lei Complementar 147/2014, que modificou a LC 123/2006, já havia incluído no regime simplificado “atividades do setor de serviços que tenham por finalidade a prestação de serviços decorrentes do exercício de atividade intelectual, de natureza técnica, científica, desportiva, artística ou cultural”.
O advogado Igor Mauler Santiago, do Sacha Calmon – Misabel Derzi Consultores e Advogados, afirma que a posição da Receita não se sustenta, pois “sociedades simples” já estão previstas no artigo 3º da Lei Complementar 123/2006. “A menção expressa à Eireli, nesse dispositivo, fez-se necessária porque esta, mesmo sendo pessoa jurídica, não é sociedade, por não estar listada no artigo 44 do Código Civil. Já a sociedade unipessoal de advocacia, como o próprio nome indica, é sociedade. Sendo-lhe vedada forma empresarial (artigo 16 do Estatuto da OAB, alterado pela Lei 13.247/2016), só pode ser simples.”
Segundo o professor e tributarista Fernando Facury Scaff, sócio do escritório Silveira, Athias, Soriano de Melo, Guimarães, Pinheiro & Scaff – Advogados e colunista da revista Consultor Jurídico, a inclusão de um tipo de sociedade no regime facilitado pode ser feita por lei ordinária, como ocorreu neste mês, pois não há regra específica sobre o tema na Constituição Federal. “A Receita adotou uma análise formalista, com viés arrecadatório”, diz Scaff.
O advogado Carter Gonçalves Batista, coordenador do Núcleo Contencioso Tributário do escritório Nelson Wilians e Advogados Associados, também discorda da interpretação literal da norma. “A Receita pratica nesse ato aquilo que afirma não poder praticar em mais de 90% dos julgados administrativos, que é exatamente afastar a incidência de uma normal legal vigente”.
Para o presidente do Instituto dos Advogados de São Paulo, José Horácio Halfeld Rezende Ribeiro, “não existe fundamento jurídico para a Receita Federal impedir a adesão ao Simples da sociedade individual, que não se confunde com o advogado autônomo”. “Qualquer sociedade registrada na OAB goza das mesmas prerrogativas legais. Para efeito de adesão ao Simples não há distinção entre espécies de sociedade”, afirmou, em nota.
Equipe de emergência
O presidente do Conselho Federal da OAB, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, convocou uma reunião para discutir o tema, na próxima quinta-feira (28/1). O presidente da seccional paulista da OAB, Marcos da Costa, diz que já está em contato com outras seccionais e com o Conselho Federal para chegar a um posicionamento sobre o tema e encomendar pareceres de tributaristas para embasar futuras providências.
A criação da sociedade unipessoal de advocacia foi sancionada no último dia 12 de janeiro. A Lei 13.247/16 amplia o Estatuto da Advocacia, permitindo que um só advogado tenha os mesmos direitos e tratamento jurídico das sociedades tradicionais.
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